5 livros que mudaram a minha vida
Os 5 livros que mudaram a minha vida
Dizer que sempre detestei a pergunta "Qual é o teu livro favorito?" parece-me uma forma um bocado forte de começar um artigo de blog. Por isso vou controlar a minha aversão por essa pergunta redutora e simplesmente dizer que ela é, na minha honesta e humilde opinião, bastante redutora.
Com tantos livros bons por aí à solta no mundo, parece-me uma perda de tempo e uma batalha inglória escolher apenas um como nosso favorito. Qualquer leitor frequente saberá que todos os livros, sem exceção, nos ensinam alguma coisa, nem que seja perceber aquilo que não gostamos. É claro que haverá sempre livros que preferimos em relação a outros, personagens com quem nos identificámos mais, enredos que nos prenderam a atenção com mais facilidade. Mas dizer que temos apenas um livro favorito parece-me frase de alguém que não leu livros suficientes para descobrir que na realidade, essa frase limita todo um mundo de novas descobertas.
Por isso é que eu prefiro a frase "livros que mudaram a minha vida", porque dá a parecer que houve uma abertura a novas descobertas, sentimentos e emoções. A minha vida era diferente antes de eu ler estes livros e agora ficou melhor. Bem… Para esta lista em particular, a minha vida ficou melhor. Será que devo fazer uma lista dos livros que mudaram a minha vida para pior?
1."A Vida Invisível de Addie LaRue", de VE Schwab
França, 1714. Addie LaRue tem apenas 20 anos quando se vê presa a um noivado com um homem que nunca viu. Pressionada pelos seus pais e forçada a providenciar uma vida melhor à sua família, Addie não vê outra alternativa senão fugir para a floresta, no dia do seu casamento. Mas quando o sol se põe, a jovem pede aos céus que a tirem desta situação. Sempre lhe foi dito que não deveria rezar aos Deuses da noite, porque nunca se sabe quem responderá. Mas no seu desespero, Addie quebra a sua promessa, acabando por realizar um pacto Faustiano com o enigmático e sombrio Luc. Em troca da sua alma, Addie poderá viver a vida que sempre quis. 300 anos mais tarde, Addie amargura o dia em que se deixara enganar por Luc. Invisível aos olhos de todos, Addie deambula pelo mundo sem nunca ser reconhecida nem lembrada. É uma sombra no mundo, impedida de deixar a sua marca. Até ao dia que entra numa livraria e conhece a única pessoa que em 300 anos, se lembra do seu nome.
A beleza deste livro deixou-me estupefacta desde os primeiros capítulos. Podia apenas ser mais um livro de fantasia, mas a fluidez da escrita, o percurso de Addie e a magia do enredo, deixaram-me agarrada. De um ponto de vista psicológico, este livro fala sobre solidão, sobre a necessidade de deixarmos uma marca no mundo em que nos inserimos. Porque se não deixarmos uma marca, então não somos ninguém, porque ninguém se lembra de nós. A sociedade ensina que nós somos as pessoas que se lembram de nós, em quem nós tivemos algum impacto no decorrer da nossa vida, pela marca que deixamos no mundo através das nossas ações. O que nos faz colocar a questão de "então se não deixarmos uma marca, qual é o nosso propósito na terra?". Recomendo este livro a toda a gente que goste de fantasia, romance, e precise de fazer uma introspeção
2.“Furiosamente Feliz”, de Jenny Lawson
Autora de blogues, livros de autoajuda, memórias e testemunhos e crónicas, Jenny Lawson fala-nos da sua experiência com a sua perturbação de ansiedade e depressão, com as quais vive desde a sua adolescência. Em “Furiosamente Feliz”, Lawson afirma estar farta de como as pessoas vêm a depressão e a ansiedade, principalmente pelos julgamentos que fazem. Por isso, depois de muitos tratamentos, acompanhamentos psicológicos e medicinas alternativas, Lawson cria o movimento “Furiosamente feliz”, um grupo de pessoas que leva a expressão “fake ‘til you make it” ao extremo. Neste movimento, independentemente do que está a acontecer, estas pessoas são sempre furiosamente felizes, para conseguirem enganar a sua depressão. Lawson sabe e afirma ao longo do livro, que isto é uma situação extrema e que a depressão é algo bem mais complexo. Contudo, não há nada mais divertido do que encarar todas as situações com uma felicidade extrema.
Como pessoa que sofre de saúde mental, o livro de Jenny Lawson ajudou-me bastante a ver a depressão e a ansiedade numa nova perspetiva. Sempre com uma boa dose de humor e sarcasmo este livro não diminui de todo o problema sério que é a ansiedade e a depressão na sociedade de hoje em dia. Apenas apresenta-o na perspetiva de quem vive com estes problemas diariamente. Ao longo do livro, Lawson apresenta vários exemplos de como é viver com depressão e ansiedade, lidar com a fama de um blog e um livro de sucesso, viver em sociedade e viver com o seu marido. É importante lembrar-nos de que atrás de uma depressão está uma pessoa que é obrigada a ser funcional todos os dias e só uma pessoa que sofra de depressão e ansiedade poderá explicar o que é que isso significa na realidade para ela.
3.“Sete Minutos depois da Meia-Noite”, de Patrick Ness
Todos os dias à mesma hora Connor tem sempre o mesmo sonho. Está deitado na sua cama quando a poucos minutos depois da meia-noite o vento aumenta e sussurra o seu nome. Connor levanta-se da cama olha para a janela para o velho cemitério atrás de sua casa e vê que a árvore de teixo que está ao lado da igreja se move de uma forma estranha. Os sussurros aumentam e o seu nome parece mais claro. Mas quando o Connor tenta perceber o que se está a passar, acorda. Na noite em que a mãe vai para o hospital, o seu sonho muda. Aos 7 minutos depois da meia-noite, o vento aumenta, o nome de Connor soa como um trovão, e na janela do seu quarto, está árvore de teixo do cemitério que agora nada se parece com uma árvore, mas sim um monstro de olhos em chama e de boca cheia de raízes. O monstro chegou para contar a Connor três histórias, e no final Connor terá que contar a quarta história e é importante que a mesma seja verdade. A verdade Conor…
Este livro foi importante para mim por 2 razões: a primeira foi porque foi o livro que inspirou a minha tese de mestrado “Em Sonhos de Sombras e pela Sombra dos Sonhos” (disponível para consulta gratuita no repositório académico do ISPA-IU), onde utilizei a história de Connor para explicar o luto da imagem materna na pré-adolescência e a passagem da posição esquizo-paranóide para a posição depressiva, tal como explicadas por Mélanie Klein. Nesta tese, as histórias foram interpretadas como sendo ferramentas úteis para que Connor compreendesse que a partir do momento em que perdesse a mãe teria que enfrentar a vida e o seu crescimento sem o apoio desta figura que lhe dava segurança e conforto. A história final, a história de Connor, é interpretada como sendo a aceitação final deste processo de luto. A segunda razão pela qual este livro foi importante para mim deve-se ao facto de no momento em que estava a preparar a minha tese também eu estava a passar por um processo de luto não de perda de figuras importantes na minha vida, mas sim a perda da liberdade da adolescência e da entrada no mundo adulto e no mercado de trabalho. O fim da universidade, da vida académica e da liberdade de ser jovem, foi um momento que trouxe ao de cima diversas inseguranças e momentos introspetivos que me ajudaram a compreender quais seriam e como seriam os próximos passos da minha vida, tanto pessoal como profissional.
4.“Eliza e os seus Monstros”, de Francesca Zappia
Eliza é a rapariga mais entrou vertida da escola. Ninguém a conhece, poucos professores sabem o seu nome e os dias de escola são sempre iguais. E é assim que Eliza quer que seja. Quanto menos der nas vistas melhor é para ela e para a sua ansiedade social. Em casa, por detrás do ecrã de computador, Eliza é uma pessoa completamente diferente. No mundo cibernauta, Eliza é LadyConstellation, a autora da websérie mais popular da Internet mundialmente, Monstrous Sea. A sua série é tão popular que grandes estúdios de Hollywood já tentaram contactar a autora anónima para transformarem a sua websérie em filmes e séries de televisão. Mas Eliza gosta do anonimato, do silêncio e da segurança que isso lhe dá. Quando Elisa conhece Wallace, a última coisa que estava à espera era que este lhe dissesse que não só era fã de Monstrous Sea, como também é o autor de fanfiction da websérie mais conhecido na Internet. Eliza vê-se então confrontada pela primeira vez com o problema de contar ou não a verdade de quem é. Mas ela nunca terá que tomar essa decisão porque é tomada por ela acidentalmente, quando a sua identidade é revelada. Conseguirá Eliza lidar com a fama?
O meu gosto por este livro focou-se inicialmente com a utilização da cultura fandom numa obra de ficção. O mundo dos fãs da cultura pop têm sido várias vezes alvo de discriminação e injurias por parte de pessoas que não compreendem na realidade o que é uma fandom. Sou membro destas comunidades desde que me lembro e sempre as achei bastante úteis para criar novos contactos, estabelecer amizades e ter momentos de autoconhecimento, para além do facto de ser extremamente divertidas. Estas comunidades de fãs ajudam nas competências sociais, no desenvolvimento da criatividade, e até mesmo no desenvolvimento de línguas estrangeiras visto que na maioria das vezes estas comunidades são internacionais. Ter uma obra de ficção que fala sobre as vantagens e as desvantagens deste mundo, bem como ter representação de ansiedade social, teve um impacto grande na minha pessoa por me sentir representada numa obra literária. Apesar de Eliza ser uma personagem ficcional, perceber que há mais pessoas no mundo real que também vivem e experienciam os mesmos medos, receios e ansiedades, fez-me sentir ouvida e compreendida. Por isso é que sou a favor de que as obras literárias e de ficção se foquem o máximo que conseguirem nas diferentes representações socioculturais do nosso mundo, seja a nível de saúde mental, etnia, cultura, saúde física, cor da pele ou sexualidade.
5.“Em caso de dúvida, escolhe o que te faz feliz”, de Manuel Clemente
Este livro foi o meu primeiro contato com o autor Manuel Clemente. Todavia, não podia ter sido um contato melhor. Escrito de uma forma leve e com capítulos curtos, Manuel Clemente apresenta diversos exemplos da sua vida e do seu dia a dia em que compreendeu que na realidade há situações em que é sempre melhor escolher aquilo que nos faz feliz, porque ninguém os escolhera por nós. Os exemplos utilizados pelo autor são variados e facilmente identificáveis na nossa vida normal. São exemplos de relações familiares, procura de emprego, vida social ou vida privada. Todos nós já passámos por situações em que escolhemos fazer coisas que os outros querem fazer, mas que não são obrigatoriamente a melhor coisa para nós o que nos leva a ficar infelizes e contrariados. Apesar de sabermos que é necessário fazer sacrifícios e compromissos, Manuel Clemente explica que nem sempre é necessário fazê-lo, porque se fizermos isso mais vezes do que fazemos coisas em nosso benefício então não estamos a viver a nossa vida, mas sim a vida dos outros. Por isso, quando somos confrontados com situações em que ficamos na dúvida sobre que caminho seguir, na maioria das vezes é preferível seguir o caminho que nos fará felizes.
Quem me conhece sabe que não sou pessoa de escrever nem de riscar os livros. Gosto de os ter impecáveis e uso sempre um marcador. Porém, este livro foi o primeiro em toda a minha vida (à exceção dos livros da escola) em que um livro me fez tanto sentido que foi necessário fazer dele diário. Enquanto lia sublinhava, riscava, escrevia e colava post-its em tudo o que me fazia sentido. Quando li este livro tinha acabado de terminar o estágio profissional para a Ordem dos Psicólogos e encontrava-me desempregada, sem saber que caminho percorrer, nem compreender se era vantajoso continuar na minha área profissional, visto que estávamos a sair da primeira vaga de confinamento da pandemia covid-19, e ninguém estava a contratar. Graças a este livro, e tendo em conta as minhas necessidades na altura, decidi percorrer o caminho que achava que me faria feliz naquela altura, voltar para a livraria Bertrand. Estar rodeada de livros, atender clientes, enfrentar a nova época escolar e o primeiro Natal pós pandemia, ajudou-me a adquirir diversas novas ferramentas, competências, qualidades, e um nível de paciência que eu nunca pensei possuir. Naquela altura ir para a Bertrand foi o que me fez feliz. Agora sei que se ler novamente o livro, as minhas escolhas serão diferentes, mas em caso de dúvida tentarei sempre seguir o caminho que me fará mais feliz.
Espero que tenham gostado desta explicação dos 5 livros que mudaram a minha vida. Nem todos os livros que leio têm um impacto tão grande. Mas estes 5 fizeram perceber que existem diversas perspetivas para o mesmo problema, e que é só uma questão de olhar para o mesmo pelos olhos de outra pessoa, ou neste caso, de uma personagem.
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Boas leituras e até à próxima divagação.
Madalena Neves Afonso
A Madalena Divaga




